terça-feira, 7 de abril de 2009

RUDOLF STEINER

RUDOLF STEINER


Rudolf Steiner nasceu em Kraljevec, cidade fronteiriça do antigo império austríaco (hoje Croácia). E ele morou em Kraljevec apenas um ano e meio. Porque, já em 1862, seu pai, um funcionário da estrada de ferro, foi transferido para Moedling, perto de Viena. E, meio ano mais tarde, transferido novamente para Pottschach, outra cidade austríaca.
O pequeno Steiner viveu até os oito anos nesta última localidade, cercada de montanhas majestosas e paisagens verdejantes. Sua atenção dividia-se, então, entre a natureza maravilhosa e o mundo tecnológico. Porque a família morava no edifício da estação de trens e ele cresceu vendo o vai-e-vem dos comboios e ouvindo o toque nervoso do telégrafo. Depois de brigar com o professor da escola, o pai decidiu ocupar-se pessoalmente de sua educação, ensinando-o a ler e escrever enquanto executava suas tarefas na estrada de ferro. Steiner era o primeiro filho do casal, mas logo ganhou a companhia de um irmão e uma irmã.
Quando tinha oito anos, uma nova transferência do pai arrastou a família para a aldeia de Neudörfl. Os altos cumes dos Alpes, antes tão próximos, tornaram-se marcos distantes no horizonte. Mas a Serra da Rosália, em cuja encosta ficava a aldeia, forneceu ao pequeno Steiner uma abundante cota de natureza. Em suas florestas, ele podia colher amoras, framboesas e morangos, com os quais complementava o pão com manteiga do jantar. E, a uma hora de marcha, havia uma fonte de água gasosa, que ele visitava diariamente na época das férias. As condições econômicas da família eram as mais modestas. O próprio Steiner referiu-se a elas com humor, anos mais tarde, dizendo que seus pais estavam dispostos a sacrificar até o último tostão pelo bem-estar dos filhos, mas que havia cada vez menos desses últimos tostões.
Em Neudörfl, ele passou a freqüentar a escola, como outros garotos de sua idade. E, aos nove anos, teve o seu primeiro contato com a geometria. Foi uma revolução interior. A existência puramente espiritual dos entes geométricos o deixou literalmente encantado. Muito tempo depois, ele diria que, na geometria, havia encontrado a felicidade pela primeira vez. A geometria forneceu a Steiner uma espécie de justificativa para o que ele mesmo experimentava. Pois, desde antes dos oito anos, começara a vivenciar o dom da clarividência. Para ele, o mundo espiritual.era tão real quanto o mundo sensorial. E, ao lado das coisas "que se enxergam", percebia a presença daquelas "que não se enxergam". Isso representava uma profunda certeza interior. Mas ele precisava provar para si mesmo que sua experiência não era fruto da ilusão. A indiscutível existência dos entes geométricos ofereceu-lhe, indiretamente, essa "prova".
O pequeno Steiner viveu uma dessas experiências inusuais numa sala da estação de Neudörfl. Sozinho, ele percebeu abrir-se uma porta que não pertencia ao mundo físico. Dela saiu uma mulher, que chegou até o meio da sala e disse algo como "procure, agora e no futuro, fazer por mim tudo o que você puder". A entidade fez ainda alguns gestos impressionantes. E desapareceu. Alguns dias mais tarde, o menino soube que, no exato momento em que aquele estranho episódio acontecia, uma pessoa íntima da família se suicidava. Fenômenos como esse são até hoje encarados com desconfiança. Na inculta e preconceituosa Europa Central do final do século 19, então, nem se fala.
Apesar da pouca idade, Steiner percebeu que, se contasse sua experiência, ele se tornaria alvo de deboches – ou até de coisa pior. Demonstrando um auto-controle que seria surpreendente até mesmo num adulto, ele se calou e só comunicou essa vivência infantil muitos anos mais tarde. O episódio da estação foi apenas a primeira experiência propiciada por uma clarividência que, em Steiner, era perfeitamente natural. Uma faculdade psíquica como essa pode produzir efeitos desastrosos numa pessoa mal estruturada. Intuitivamente, o garoto logo percebeu que, se quisesse manter a lucidez e integrar o seu dom numa vida psíquica saudável, precisava construir uma sóbria e sólida visão da realidade. As ferramentas para isso eram as matemáticas, as ciências naturais e a filosofia. O menino teve a felicidade de encontrar, em seu professor e no padre da igreja local, não apenas incentivadores caloroso. Mas também pessoas esclarecidas, que influenciaram fortemente sua própria evolução intelectual. Esse padre reuniu, certa vez, os alunos mais adiantados e explicou-lhe longamente o sistema planetário de Copérnico, os movimentos de translação e rotação da Terra, a inclinação do eixo terrestre e as estações do ano – assuntos que, ainda naquela época, muitos religiosos consideravam tabus. A Steiner, ofereceu um ensinamento extra sobre os eclipses do Sol e da Lua. O entusiasmo causado por essas informações reverberou durante dias na mente do menino.
A partir dos 10 anos, Steiner passou a freqüentar o liceu da cidade vizinha de Wiener-Neustadt. O trajeto até lá era feito normalmente de trem. Mas as freqüentes interrupções no serviço ferroviário obrigavam-no, muitas vezes, a fazer o percurso a pé. Isso significava uma hora de marcha, com tempo bom. Ou uma caminhada bem mais lenta e difícil, com neve até os joelhos, nos dias de inverno. Esses esforços físicos não intimidavam o rapaz. O que o deixava aturdido eram os estímulos sensoriais da cidade grande. Ele se refugiava, então, no mundo puramente ideal da matemática, onde seu espírito se sentia em casa. Em pouco tempo, dominou sozinho o cálculo integral. E, combinando o que aprendia em aula com suas iniciativas como autodidata, adquiriu também notáveis conhecimentos em geometria descritiva e estatística. Quanto à geometria propriamente dita, ele afirmaria mais tarde que estava "completamente doido por ela". A escola soube reconhecer o seu talento e atribuiu-lhe uma nota que jamais havia sido dada.
Aos 14 anos, Steiner adquiriu um exemplar de A crítica da razão pura, de Kant – uma obra filosófica difícil, que muito intelectual adulto não teria coragem de encarar. Como não tinha tempo de ler em casa, pois precisava realizar os deveres escolares e ajudar no trabalho doméstico, resolveu fazê-lo durante as aborrecidas aulas de história. Desmontou o livro de Kant e colou cuidadosamente cada uma de suas páginas entre as folhas do manual escolar. Fingindo acompanhar as exposições do professor, estudou metodicamente a filosofia kantiana. Kant estreitara drasticamente o horizonte cognitivo da humanidade, considerando cognoscível apenas aquilo que podia ser apreendido pelos sentidos. Steiner, que conhecia o mundo espiritual até melhor do que o mundo sensorial, sabia, por experiência própria, que essa posição era, no mínimo, insuficiente.
Todo o grande trabalho intelectual de sua juventude – desenvolvido a partir dos 21, quando editou e comentou os escritos científicos de Goethe – foi pautado pela necessidade de construir uma teoria do conhecimento alternativa à de Kant. Foi com base nela que ele pode, mais tarde, edificar sua antroposofia. Mas, aos 14 anos, a atenção de Steiner ainda estava intensamente mobilizada pelo estudo das matemáticas e das ciências naturais. Bem como pela leitura da história, da doutrina e do simbolismo cristãos. Para custear sua educação, começou a dar aulas particulares, tendo, como alunos, tanto estudantes mais jovens quanto seus próprios colegas de classe.
Aos 18 anos, graduou-se com distinção no liceu, recebendo o conceito "exemplar". Por pressão do pai, que queria fazer dele engenheiro, Steiner se matriculou na Escola Politécnica de Viena. Enquanto as aulas não começavam, prosseguiu sua investigação pessoal da filosofia. Tendo completado o estudo de Kant, vendeu seus velhos livros escolares e, com o dinheiro recebido, comprou uma série de obras dos grandes filósofos do idealismo alemão: Fichte, Hegel, Schelling e seguidores. A questão que o motivava era a atividade cognitiva do "eu" humano. Por experiência própria, ele estava convencido de que o "eu" era espírito e vivia num mundo de seres espirituais. O processo de conhecimento construía uma ponte que ligava esse domínio supranatural à natureza.
Steiner continuava a manter em segredo os seus dons paranormais. Apenas com duas pessoas, ele compartilhou, nessa época, suas experiências. O primeiro era um homem do povo, com mais de 40 anos, que colhia ervas medicinais no campo para vendê-las às farmácias vienenses. Chamava-se Felix Koguzki. O jovem Steiner o conheceu no trem. Era uma pessoa simples, que nada sabia de ciências e filosofia. Possuia, porém, uma sabedoria inata, elementar e criativa. E uma experiência profunda tanto do mundo natural quanto do mundo espiritual. Steiner tornou-se amigo desse colhedor de ervas, junto do qual sentia estar na presença de uma alma muito antiga, que lhe trazia o saber instintivo de uma época intocada pela civilização.
O segundo interlocutor era ainda mais misterioso. Não conhecemos sequer o seu nome. Sabemos apenas que, sob o disfarce de uma profissão modesta, exercia conscientemente uma missão espiritual. Era grande conhecedor de ciências e filosofia e exerceu uma influência profunda na evolução do pensamento de Steiner. Este já havia estabelecido sua grande meta: religar a ciência e a espiritualidade, reintroduzir Deus na ciência e a natureza na religião, e, a partir disso, fecundar de novo a vida e a arte. Seu mestre oculto indicou-lhe o caminho a seguir para alcançar esse objetivo.
O adversário a ser combatido era a visão de mundo materialista e reducionista, que dominava o pensamento científico e toda a consciência intelectual da segunda metade do século 19. Se quisesse vencer esse modo de pensar, Steiner devia começar por conhecê-lo a fundo e reconhecer a parcela limitada de verdade que existia nessa cosmovisão. Só então estaria capacitado a falar ao homem moderno nos termos que ele era capaz de compreender.
Steiner mergulhou ainda mais fundo no estudo das ciências da natureza. E na vibrante atividade dos círculos intelectuais e artísticos vienenses. Aos 19 anos, conheceu um outro homem, que exerceria uma influência decisiva em sua vida: Karl Julius Schröer, poeta e erudito, que lecionava literatura alemã na Escola Politécnica de Viena. Schröer estava trabalhando na edição e comentário da segunda parte do Fausto, de Goethe. Por meio dele, Steiner travou contato com a obra e o pensamento do grande poeta alemão.
A conexão de Schröer com a herança goethiana era tão profunda que, quando conversava com seu professor, por horas a fio, Steiner tinha a sensação de que uma terceira entidade se fazia presente: o espírito do próprio Goethe. Foi por indicação de Schröer que, em 1882, ele foi convidado a editar os escritos científicos goethianos. Steiner os publicou em cinco livros, acompanhados por comentários que mostram o quanto havia progredido em sua própria reflexão filosófica.
Em oposição às idéias científicas de sua época, que concebiam a natureza como um mecanismo frio e sem alma, constituído apenas por matéria em movimento, Goethe (1749-1832) vira o mundo natural como uma uma totalidade viva e orgânica, impregnada de espírito. Essa visão de mundo vinha ao encontro de tudo aquilo que Steiner havia descoberto por experiência própria. Sua grande tarefa foi tornar explícito e sistemático esse pensamento que, na obra de Goethe, é apenas insinuado. Não é exagero dizer que ele a realizou de maneira magistral. Com a edição do último volume dos escritos goethianos se encerrou, em 1897, a etapa inicial de sua vida. Ele estava pronto para voar muito alto, com suas próprias asas.
A partir de 1899 participou da escola para a instrução de operários em Berlim fundada por Wilhelm Liebknecht. Depois de 1902 Steiner começou a proferir palestras a convite do movimento teosófico. Desse movimento nasceu mais tarde a sociedade antroposófica (1913, Munique).
Steiner deu também sugestões para novos caminhos em muitas áreas práticas como na pedagogia, na medicina, na agricultura, na arquitetura, e artes. Seus livros abordam os mais variados temas e são amplamente divulgados.

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